Hoje eu quero brincar de analisar a letra da música do nosso querido compositor brasileiro Noel Rosa:
“Nosso amor que eu não esqueço / E que teve o seu começo / Numa festa de São João. / Morre hoje sem foguete / Sem retrato e sem bilhete / Sem luar, sem violão / Perto de você me calo / Tudo penso e nada falo / Tenho medo de chorar / Nunca mais quero o seu beijo / Mas meu último desejo / Você não pode negar / Se alguma pessoa amiga / Pedir que você lhe diga / Se você me quer ou não / Diga que você me adora / Que você lamenta e chora / A nossa separação / Às pessoas que eu detesto / Diga sempre que eu não presto / Que meu lar é o botequim / Que eu arruinei sua vida / Que eu não mereço a comida / Que você pagou pra mim.”
Noel dá início ao seu pensamento falando da festa do início dos relacionamentos. De quando tudo é bonito, tudo é alegria. Depois ele menciona que ao contrário disso, o fim do romance dolorido, sofrido, sem música, triste mesmo.
Ele traz à tona sentimentos negativos tão próximos de nós quando nosso amor vai embora, quando o tempo bom se vai. Desfazer as malas e dar adeus nunca foi tarefa muito fácil para a maioria das pessoas.
O vínculo amoroso que antes era bom, agora tem gosto amargo, nos chicoteia, nos machuca, nos fere. Requer de nós uma pausa, um tempo.
Depois o Noel amplia a perda que até agora só interessava ao casal e fala dos outros. Sim, dos amigos, dos parentes, dos conhecidos. De alguma forma era como se todos os outros também tivessem feito parte daquela história e que tivessem, os dois, que dar satisfação à sociedade.
Essa poesia me chama a atenção pois em tempos de redes sociais parece que estamos muitíssimo preocupados com o que os outros vão pensar de nós. Já era assim na época de Noel e, de alguma forma, sempre será, pois o ser humano é um ser social. Ninguém é uma ilha, já dizia John Donne.
Pedir ao outro que fale para os outros que “você me adora, que você lamenta e chora a nossa separação” é solicitar que o ex-parceiro reconheça, ainda que não seja verdade, publicamente, que ‘eu’ sou uma pessoa do bem, que eu fui/sou amado(a); que mereço coisas boas e sou importante. No mesmo texto, o poeta também pede o contrário: “às pessoas que detesto diga que não presto, que meu lar é um botequim.”
Cumprindo o velho ditado: “falem mal, mas falem de mim.”
O ser humano precisa de reconhecimento, talvez esse seja mesmo seu último desejo.